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UNAS Heliópolis

Povos Originários | Ancestralidade e cultura indígena em meios urbanos

“A gente ainda vive diversos estereótipos desses povos, mas eles são merecedores de serem reconhecidos, depois de passar um processo de conhecimento percebi que a sociedade desenha uma imagem falsa deles, eu fui transformada com esse contato”. Ressalta Simone Maria Bisneta de uma mulher indígena.


Hoje, dia 09 de Agosto é comemorado o Dia Internacional dos Povos Indígenas. A data foi instituída pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 1994. Pensando nisso a UNAS em uma movimentação interna fez um mapeamento de quem se identifica enquanto indígena, respeitando a importância do autoconhecimento. Com esse mapeamento pudemos perceber que os poucos indígenas no meio urbano que trabalham ou não conosco sofrem com um apagamento cultural, afetivo e histórico.


Para entendermos como acontece esse apagamento ou em muitos casos a falta de identificação com esses povos é necessário fazer um retorno na nossa história. Lá atrás em Pindorama como era conhecido o Brasil, os povos eram livres, nômades, e acima de tudo parte da natureza, o território era a própria existência, tudo que envolve a vida, onde se plantava, onde se pescava, onde toda uma troca acontecia naturalmente sem interesse, mas infelizmente com as colonizações a natureza começou a ser vista como um recurso a ser explorado, em grande parte não renovável.


Hoje falamos mais da história real do nosso país, mas temos que entender que a história manchada de sangue no nível como foi manchado, muitos povos foram expulsos, tiveram que ser retirados vivos ou não da natureza onde faziam parte, pois o território é a própria existência, é a vida, principalmente para os povos originários, ainda temos muito que reaprender com eles, Maria Agraciada é Tupinamba e Idealizadora do Instituto Etno nos contou que “quando os povos forçadamente aceitam a colonização muito se perde com isso, como a língua, a possibilidade de plantar seu alimento, a cultura diária, os grafismos, a espiritualidade, então sobra os corpos, as memórias e o sangue…”

Hoje no Brasil (antiga Pindorama) temos 300 povos vivos, que falam 275 línguas, então ao falar Indígêna, é de uma forma muito ampla no que diz respeito a esses povos, dentro de nossa instituição encontramos 6 pessoas que se declararam como Indígenas, após constatá-las elas nos revelam que se identificam por conta de seus traços ou por conta de um vínculo territorial ou por conta de uma ancestralidade vinculado a seus avós e ou bisavós, esse apagamento histórico e familiar é comum em diversos indígenas, a maioria realmente tem esse apagamento, mas se existe uma história uma ligação ancestral, existe uma energia que recaí sobre esses corpos, saber disso faz essas pessoas se reconhecerem e sem dúvidas se compreenderem.

Simone Maria Bortolotto dos Santos, é formada em pedagogia e trabalha no CEI Climax I, se identificou enquanto Indígena, nos contou que seu vínculo com os povos originários vem por conta de sua bisavó que morava em Pau-Brasil, Bahía, mas que por muito tempo só alimentou esse vínculo através de histórias contadas pelo seu pai, mas foi na faculdade em uma disciplina de multiculturalismo começou a reconhecer sua “mistura” familiar, mas quando chegou no seu TCC ela resolveu fazer uma proposta pedagógica para a educação escolar infantil na escola CEI/CECI (Centro de Educação e Cultura Indígena) que fica localizado no Jaraguá, em São Paulo, a pedagoga nos detalhou suas três visitas às escolas e foi ali que pode se conectar com sua ancestralidade, com essa força que muitas vezes não é necessário ser explicada mas como tudo na natureza precisa ser sentida. Simone ainda nos revelou que “a gente ainda vive diversos estereótipos desses povos, mas eles são merecedores de serem reconhecidos, depois de passar um processo de conhecimento percebi que a sociedade desenha uma imagem falsa deles, eu fui transformada com esse contato”.

Outra pessoa que se identificou como Indígena em nosso mapeamento foi Elcilena Azevedo Lima que é Coordenadora Pedagógica do CEI Minervino, é natural de Belém do Pará e filha de uma benzedeira, e nos detalhou que seu contato é muito cultural, a cidade onde nasceu tem uma ligação muito forte com a culinária Indígena, o trato da mandioca é exemplificado por ela por ter diversas preparações, a farinha, o tucupi, a tapioca, a goma são exemplos muito claros que esse alimento está muito enraizado no dia a dia de quem vive na cidade, segundo ela todo esse trato do legume é uma memória ancestral que a cidade carrega, mesmo que a arquitetura seja europeia a culinária, a dança, a arte é Indigena “Eu digo que o lugar está dentro de mim, não estou lá mas o lugar está dentro de mim, não deixo de comer minha farinha, em casa tenho minhas cerâmicas, as músicas como o Carimbó, tudo tá sempre ligado a mim, volto lá todo ano, aqui em São Paulo eu vejo que não tem representação, mas todo mundo conhece farinha de mandioca e isso vem da onde? Como eu não nasci dentro de uma etnia, eu me encontro numa identificação cultural” disse ela ao revelar da onde vem sua identificação.


A identificação de pessoas como Simone e Elcilena é importantíssima e não deve ser excluída, aliás deve ser incentivada o tempo todo, esses povos estão em nosso sangue, nossa terra e em nossa memória. Maria Agraciada nos expõe a importância disso “a partir do momento que voltamos a se auto reconhecer, se auto declarar, toda a força ancestral cai sobre nós e a nossa vida automaticamente começa a mudar, porque simplesmente a gente assumiu o nosso lugar, o nosso lugar no mundo e afirmou nossa identidade, isso nos fortalece pelo simples fato de entendermos quem somos e onde estamos”.


Se você de alguma forma se reconhece fisicamente, culturalmente ou até ancestralmente com os povos originários mas não sabe se pode ou como iniciar essa identificação, entenda que é importantíssimo esse reencontro, mas se ainda tem dúvidas de como recuperar o vínculo mesmo não sabendo por onde começar entenda que “saiba que o seu território único é o corpo que é construído pelo passado, pela ancestralidade, pelo sentimento profundo, se juntando a seus parentes (povos indígenas de outras etnias), se autodeclarando, se conectando com o todo, com a natureza, estar sensível a tudo que a natureza pode oferecer” como ressalta Maria Agraciada, “O indígena não acha que as coisas da natureza são externas a ele, ele sente que ele e a natureza são uma coisa só” completou ela.


Queremos mapear os Indígenas dentro das comunidades, quem sabe conseguiremos juntos criar um movimento indígena pulsante e ativo em Heliópolis algum dia, fazendo com que outras comunidades também possam se mapear para que juntos as lutas se Intensifiquem, os povos originários estão no nosso sangue e dentro das favelas as histórias se cruzam diariamente revelando que quem está à margem tem muito mais em comum do que possam imaginar.